Arquitetura

MEDIZ NOVELA – Cenografia e produção de arte de ‘Três Graças’ retratam universos opostos de São Paulo

Casa de Arminda (Grazi Massafera). *** Local Caption *** Cap1 – Casa de Arminda (Grazi Massafera).

Casa de Arminda (Grazi Massafera)

Fotos: Estevan Avellar/TV Globo

Uma novela que não disfarça sua ficção, mas a assume com força estética – é como os criadores de ‘Três Graças’ a definem. Ambientada em diferentes polos da capital paulista, a trama é imersa em uma atmosfera que envolve drama, humor, romance e mistérios, e passeia pelos diferentes núcleos dos personagens. May Martins, a diretora de arte responsável por aplicar o conceito em parceria com o diretor artístico Luiz Henrique Rios reforça que, além de se traduzir visualmente, a ideia também transparece na forma como as gravações são conduzidas: “Ele utiliza lentes e zooms com movimentos que acompanham essa respiração e esse pulso. No fim das contas, há perigos ali, as situações são extremas”, pontua May, que também destaca a importância da permeabilidade dos espaços para reforçar o suspense da trama. “Os ambientes são muito integrados, o que contribui para a fluidez narrativa. Sempre há algo acontecendo em algum lugar”, explica.

Casa de Arminda (Grazi Massafera) 

Casa de Arminda (Grazi Massafera) 

A cenografia, nesse contexto, equilibra-se entre o real e o ficcional. “A arquitetura é concreta. Podemos exagerar nas cores e nos detalhes, mas a proporção precisa ser verdadeira”, afirma a cenógrafa Cristiane Fassini. Com referências à estética do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, a paleta de cores torna-se essencial em cada núcleo. Além do verde, as cores primárias — vermelho, azul e amarelo — e seus subtons estão presentes não apenas nos cenários, mas também nos figurinos e objetos de cena. Nos núcleos mais abastados, como o apartamento da família de Ferette (Murilo Benício), foram utilizadas cores pigmentadas e sóbrias; já na Chacrinha, a comunidade fictícia da trama, predominam tons mais abertos. A iluminação também foi pensada para dialogar com essas paletas.

A cidade cenográfica da Chacrinha nos Estúdios Globo, no Rio de Janeiro, planejada por Cristiane, representa um recorte da periferia de São Paulo, inspirado em visitas de pesquisa e observação na capital. “Mantivemos o arruamento anterior, mas verticalizamos as construções para remeter à Brasilândia. Criamos segundos andares e dividimos casas grandes em menores, alterando cores e esquadrias para transmitir a sensação de multiplicidade”, explica. Cristiane também destaca a riqueza dos interiores construídos, como a laje de Bagdá (Xamã) – com direito a banheira de hidromassagem -, a igreja do pastor Albérico (Enrique Diaz), o posto de saúde e a farmácia da Fundação Ferette, onde Viviane (Gabriela Loran) trabalha.

A produtora de arte Nininha Medicis reforça o compromisso com a vivacidade dos cenários. Durante as gravações em São Paulo, a equipe de produção de arte inseriu elementos nas cenas filmadas na Brasilândia. “Levamos muitos camelôs, cartazes, faixas, carrinhos de papelão — tudo para garantir vida constante”, conta. Um caminhão repleto de materiais foi enviado para compor a laje do personagem Bagdá e outros cenários, incluindo churrasqueira, narguilé, pipa e caixas de som com LEDs.

Cap 9 – cena 30 – Aclimação.

Também situada na fictícia Chacrinha, mas com interior construído em estúdio, a casa onde Gerluce (Sophie Charlotte) vive com a mãe Lígia (Dira Paes) e a filha Joélly (Alana Cabral) foi concebida para traduzir afeto e memória. Trata-se de uma construção orgânica, feita aos poucos, como nas comunidades. Cada cômodo tem estilo próprio, com pisos variados e puxadinhos. A fachada é amarela, com portas azuis. “Arroz e feijão ficam em potes de sorvete, tem paninhos de prato com silk, quadrinhos de casca de ovo pintados na escola. É um espaço que conta a história da vida delas”, revela Nininha.

Apartamento da família Ferette.

A novela também apresenta diversas cenas filmadas nas ruas de São Paulo, integradas ao cotidiano do transporte público rodoviário. Na fase inicial de externas, a produção de arte trabalhou com três ônibus, incluindo um elétrico, completamente adereçado para as cenas com o motorista Gilmar (Amaury Lorenzo). O trabalho envolveu adesivagem e criação de elementos como estação de cobrador, validador de cartão e câmeras de segurança.

Gerluce (Sophie Charlotte) e Joélly (Alana Cabral)

Entre os cenários dos personagens mais ricos, o eclético casarão da vilã Arminda (Grazi Massafera) se destaca. Ficcionalmente ambientada no bairro da Aclimação, zona central de São Paulo, a mansão também foi reproduzida em cidade cenográfica nos Estúdios Globo. “É uma casa de poucas cores, mas muito intensas”, define May Martins. “Ela coleciona lupas, ampulhetas, objetos acumulados. É como o castelo da bruxa”, complementa Nininha.

Um dos cenários da mansão, o quarto onde está a escultura As Três Graças, tem grande importância na trama. O cômodo, uma antiga biblioteca hoje desativada, é cercado por livros e móveis de outras gerações, com uma atmosfera de mistério que envolve a obra. A escultura, com 1,80m de altura, que representa deusas da mitologia grega, foi produzida em resina com pó de mármore na fábrica de cenários dos Estúdios Globo.
Espaços que concentram poder e riqueza, como o apartamento e a Fundação Ferette, também receberam atenção especial. “A fundação tem um propósito aparentemente simpático, então usamos um verde solene pontuado por um laranja muito controlado”, explica May. “A casa do Ferette tem uma alegria que vem da mulher, Zenilda (Andréia Horta), mas também carrega uma cor de esperança”, destaca. Cristiane, a cenógrafa, reforça que o apartamento foi inspirado em imóveis de alto padrão dos bairros nobres de São Paulo, com arquitetura moderna e grandes paredes de vidro.
A galeria de arte administrada por Kasper (Miguel Falabella) e João Rubens (Samuel de Assis) é uma extensão da residência do casal. Na frente, há um salão de exposição com arquitetura industrial; nos fundos, a casa. Entre os dois espaços, um pátio com muitas plantas e esculturas. “O casal tem gosto refinado e lida com arte. A arquitetura é neutra, mas com móveis ousados e obras de arte, refletindo a personalidade deles”, explica Cristiane.

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